“Chão comum”: dimensão solidária da cidadania
Autor | Vinícius Almada Mozetic |
O presente artigo
Não podemos negar a necessidade de uma busca frenética de efetividade para aqueles direitos fundamentais, e que entendemos precisarem de um “carinho cidadão” preparatório para as diferentes problemáticas e transformações espaciais pelos quais perpassam.
O conjunto de possibilidades e necessidades estratégicas para uma aplicabilidade efetiva na transformação dos direitos sociais fundamentais, principalmente no espaço local, precisam ser instrumentalizados mediante políticas públicas - Estado - e pela participação comprometida das comunidades locais.
Numa sociedade democrática os diferentes conflitos sociais apresentam uma necessidade premente do deslocamento do eixo das decisões estruturais do Estado para as comunidades sociedades.
Ainda sobre as questões atinentes à participação dos cidadãos sobre as regras e decisões da “res pública” uma vez legitimados para tal, faremos uma breve análise do verdadeiro significado de “cidadania”, e abordaremos tipos distintos de transformações dos direitos sociais num repensar construtivo de Estado, a virtude cívica dos cidadãos e o espaço local como “chão comum” à realização dos anseios comunitários; em busca da felicidade.
A idéia que se tem de Estado social é aquela em que o Estado regula e também promove o bem-estar; ganhando dimensão globalizada somente depois da segunda grande guerra. Há necessidade, para um melhor entendimento, de um estudo dimensionado dos direitos humanos diante a sua relevante transformação – crescimento, num processo Estado-sociedade, e abertura de novos horizontes frente às demandas sociais relativizadas pelos diferentes espaços locais.
No que se refere ao bem estar social importante ressaltar o caráter finalístico estreitamente ligado à necessidade de aplicabilidade de políticas públicas – atividade estatal – para a proteção do cidadão, ou seja, no entendimento de Norberto Bobbio
[...] de tipos mínimos de renda, alimentação, saúde, habitação, educação, assegurados a todo o cidadão, não como uma caridade, mas como direito político, mas diante a sua história feita de constantes mudanças de rumo e direção, mantendo um sentido que lhe é próprio.
Todavia, quando se faz uma análise mais demorada das origens, dos princípios e implementações do nosso Direito Estatal – quase sempre identificado com a estrutura de poder e desvinculado das práticas sociais comunitárias – compreende-se com mais facilidade as raízes de seu exaurimento. Esta estrutura periférica é dependente e profundamente atingida por violentas contradições e incontidos conflitos de natureza social, econômica e política
O desenvolvimento da própria sociedade cria constantes e crescentes necessidades que nem sempre poderão ser completamente satisfeitas. A não realização ou negação, total ou parcial, dessas necessidades essenciais, principalmente quando geradas pelo moderno, “desenvolvimento da produção e da divisão social do trabalho” acabam gerando contradições, conflitos e lutas
Seguindo essa linha de pensamento, a ideia do direito social é, portanto, um produto essencialmente dos tempos modernos, Foi necessária, como salienta Gurvitch
Segundo Gurvitch
[...] o direito social visto apenas como um conjunto de regras jurídicas, especialmente as leis produzidas pelo Estado, protetoras dos despossuídos da sociedade e organizando a intervenção do Estado no domínio econômico, tem um duplo risco, pois, desde logo, propõe uma interpretação errônea do fenômeno, escamoteando o aspecto da pluralidade de ordens aberto pela ideia mesma de direito social e caracterizado pelo fato de “cada grupo e cada conjunto possui, efetivamente, a capacidade de produzir sua própria ordem jurídica autônoma, regulando sua vida interna”.
Já para Habernas, o fenômeno do poder moderno não se caracteriza como a chance de impor, no âmbito de uma relação social, a sua própria vontade contra vontades opostas, mas sim, o potencial de uma vontade comum formada numa comunicação não coatada, isto porque o poder nasce da capacidade humana de agir ou de fazer algo, associando-se com outros e entendendo-se com eles.
Todavia, isto só ocorre em espaços próprios em que possam se desenvolver estruturas de intersubjetividade formadas a partir de interlocuções não deformadas.
Uma democracia sustentada na ação comunicativa tende a efetuar uma adesão política, que por sua vez, só pode ser constituída a partir de compromissos e ações ético-políticas; voltadas ao consenso e entendimento sociais, que Habermas nomina de um auto-entendimento hermenêutico de coletividade, possibilitadora de uma autocompreensão autêntica e condutora à crítica e fortalecimento de um projeto de identidade e vida coletiva
Importante aspecto a ser observado se refere à legitimidade apontada por Habermas, que segundo Rogério Gesta Leal
“O espaço institucional do Estado Administrador Democrático de Direito, nesta perspectiva, é privilegiado para os fins de fomentar, e mesmo viabilizar, uma maior articulação de possibilidades implementadoras das condições objetivas à interlocução social reflexiva sobre todos estes temas, oportunizando o surgimento de um processo de autopersuasão, no qual é impossível se pensar em não-participantes, isto porque todos membros têm que poder tomar parte no discurso, mesmo que os modos sejam diferentes. Cada um deve ter basicamente as mesmas chances de tomar posição sobre todos os proferimentos relevantes. Quando assim não age o Estado, há uma agudização na crise de identidade, legitimidade e eficácia das instituições representativas e mesmo do poder instituído”.
Essa idéia proposta pelo autor revela o reconhecimento social resultado do processo de articulação comunicativa por parte dos diferentes atores sociais.
A visão democrática radical de Habermas postula a inclusão de todos os cidadãos na base de igualdade de direitos. Tal compreensão da democracia, cujas bases foram lançadas por J.J.Rousseau, é dinâmica, pois está apoiada do direito e na idéia de que a sociedade democrática atua sobre si mesma por intermédio de meios políticos. Nela, os destinatários das leis são, ao mesmo tempo, seus autores
O conceito procedimental de poder político e social intensifica de forma necessária o processo de democratização da sociedade e processo de transformação desta mesma sociedade, lócus privilegiado da produção de relações e das possibilidades conceituais e operacionais do poder
Tal ponto de partida implica no reconhecimento de que o processo de democratização do poder e da sociedade é permanente e longo, mediado, de um lado, por uma linguagem e comunicação política includente e aberta, e de outro lado, pela interação de instituições políticas tradicionais, pelos valores da esfera societária na qual se encontram estas instituições, e pelos movimentos sociais organizados ou espontâneos
Por essa razão os governos...
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